15 de setembro de 2012

A LIBERDADE

«A Liberdade

E alguém pediu: Fala-nos da Liberdade.

– Às portas da cidade e das vossas casas dei convosco na adoração da vossa própria liberdade, como escravos que se humilham diante de um tirano e que o glorificam enquanto ele os destrói.
...

No bosque do templo e na sombra da cidadela vi os mais livres de vós usar a liberdade como prisão e algemas. O meu coração entristeceu-se, pois nunca sereis livres senão quando o próprio desejo de chegar à liberdade se tornar para vós uma prioridade, e quando deixardes de falar de liberdade como de um fim e de uma conclusão.

Sereis livres, não quando os vossos dias decorrerem sem cuidados e as vossas noites sem desejos e sem fadigas, mas quando todas estas coisas cercarem a vossa vida e vos elevardes acima delas, nus e livres.

Mas como podereis estar acima dos vossos dias e das vossas noites se não quebrardes as cadeias que na alvorada do vosso uso da razão fizestes pesar sobre a luz do vosso dia?

Ao que chamais liberdade é a mais forte destas cadeias, ainda que os seus anéis vos deslumbrem brilhando ao sol.

E tudo o que quereis afastar para ficardes livres não passam de fragmentos de vós mesmos.

Se é uma lei injusta que quereis abolir, lembrai-vos que tal lei foi escrita pela vossa própria mão. Não podeis apagá-la queimando vossos livros de Leis, nem lavando os rostos dos vossos juízes, ainda que entorneis toda a água do mar sobre as suas cabeças.

E se é um déspota que quereis destronar, cuidai antes de mais que o seu trono em vós esteja bem destruído. Como pode um tirano dominar homens verdadeiramente livres se não pela tirania que está na sua própria liberdade e a vergonha na sua própria altivez?

E se é uma inquietação que quereis expulsar, tal inquietação foi escolhida por vós e não imposta de fora.

E se quereis dissipar o medo, a sede desse medo é o vosso coração e não a mão que vos assusta.

Todas as coisas que se movem no mais íntimo do vosso ser num constante abraço, tanto as desejadas como as temidas, as repugnantes e as tentadoras, as que procurais como aquelas de que fugis.

Movem-se dentro de vós como luzes e sombras em pares estreitamente unidos. E quando a sombra se debilita e desaparece, a luz que demora torna-se sombra de uma outra luz. Assim, a vossa liberdade desembaraçada de estorvos torna-se ela própria embaraço de uma liberdade maior.»
Khalil Gibran in 'O Profeta'

Sem comentários: